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Golem Pedagógico: Os Coachs na Educação

  • Foto do escritor: Fábio Tardelli
    Fábio Tardelli
  • 25 de jul. de 2020
  • 7 min de leitura

Mary Shelley, grande escritora, não criou o conceito de Golem (apesar de ter o popularizado). Na verdade, essa criatura da forma como conhecemos tem origem na cultura judaica e se desenvolveu e popularizou na República Checa entre os anos de 1500 e 1700. Um golem seria uma criatura originada de material inanimado a partir de ritual divino, e, posteriormente, ganhou sentido mágico no universo das literaturas mágico-medievais e, também, científico com Shelley.

Existem golens de Carne (o monstro de Mary Shelley, Frankenstein é o mais famoso), golens bonecos (Chucky o brinquedo assassino e um punhado de brinquedos assassinos dos filmes dos anos 80 e 90), golens de pedra (muito comuns de joguinhos como Pokemon, League Of Leagends e Clash Of Clans) e agora apresento-lhes: O GOLEM PEDAGÓGICO.

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(O Golem pedagógico é mais ou menos assim: punhado de informações, fragmentos de textos que podem ser do Twitter, FB e Insta e alguma fraseologia aprendida nos corredores universitários)


O Golem pedagógico é uma criatura formada por misto de esquerdismos, concepções liberais de educação (normalmente variações de escolanovismo que nada mais é que uma concepção burguesa de educação, como a Escola da Ponte e tantas outras que iludem o professorado) e até auto ajuda/ coach com toques de Cortela, Karnal, Isami Tiba e Augusto Cury. É difícil achar propriamente a receita de criar esse Golem, separar aonde começa um pedaço e termina outro, e percebe-lo é tarefa árdua.

Mas é possível o rastrear seu engatinhar na formação inicial do Professor. E aí o monstrinho age como um desastre completo! Projetemos o seguinte processo: o estudante de escola pública se forma no Ensino Médio e por alguma influência positiva, ou mesmo por outras razões, tem como projeto de vida ser professor da Educação Básica e fazer uma construção significativa. Meta e causa nobres. Esse estudante se mata em cursinhos populares, estudando por conta... Passa no vestibular eeeeeeee catapimbas!

Toda sua formação é feita lendo: teorias financiadas por CIA nos anos 1950 até 80 para implodir comunistas pelo mundo (Arendt, Mbembe, Bauman, Popper), educação bancária e toda sua lógica clientelista e contra organizações de trabalhadores (Zabala, Tardiff, Ausubel) e, se muito, um lampejo de uma única professora da graduação, aquela gramsciana do curso, ele tromba um Florestan e algo entre Freire ou Saviani.

E se o curso é pedagogia a coisa é mais brutal ainda, porque seu processo de exclusão é violentamente pautado na questão de gênero. Se discute muito feminismo nesse curso, disso não tenho dúvidas, mas qual feminismo? Feminismo de senso comum de internet. Não se lê Clara Zetkin, Kollontai, Angela Davis, Krupskaya, Soledad Villafranca... E disso se discute mais tempo trocas de fraldas, rabanetes no esforço, jogos financeiros para crianças, roupa rosa e azul para bebês... Muita coisa que somadas não forma além da “tia da Educação Infantil”.


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(Mary Shelley)


Mas isso quando o Golem é formado no Ensino Superior de uma BOA Federal. Com cursos no Ensino Privado cada vez mais formatados para formação barata de mão de obra diplomada e sem nenhuma qualidade, reflexo também de políticas públicas esquerdistas, quantos não se formam sem sequer chegar perto mesmo dessa bibliografia de CIA e auto ajuda? O pessoal chega se formar sem LER UM LIVRO!

Ficando mais vulneráveis ainda a todo vômito virtual dos Coachs e Youtubers. E aí vai da “clientela” até afirmar que “alunos negros são propícios a irem bem nas aulas de Ed. Física porque estão acostumados a fugirem da polícia” e o mais brutal senso comum estúpido e ignorante disponível na sociedade capitalista...

Depois de crescido o Golem fica fácil achar sua trilha de desastres. Mas nesse ponto, suas trilhas e desastres são devastadores... Imaginem os mais crítico entre docentes da educação básica influenciados por ele! O caminho, infelizmente, adotado é: sindicatos e universidades. Ou seja; produzir pesquisas e militância naquele prisma sem pé nem cabeça que vai do Cortela à CIA. No processo aprende algumas palavras de ordem de Freire, Marx e Lenin.

Para o Golem ficar adulto quanto mais pedaços desse mosaico mais interessante fica, é quase uma antropofagia (seria uma "golemfagia"? rs) auto destrutiva. Como se os tupinambás, os que eram adeptos da antropofagia, do Brasil colônia ao invés de, buscarem as qualidades de seus oponentes buscassem um mistão de nada.

É um caminhar complexo porque ele, nessa altura, já fundiu interesses pessoais, má formação, palavras de ordem e está construindo com outros como ele. Organizando grupos de estudo, debate, militância e coletivos sindicais.


[Parece demais muita gente que conhecemos em comum, não é? Não é indireta, é uma análise processual de como as coisas estão no campo da Educação e o porque estamos incapazes de mobilizar a categoria para enfrentar o EaD, para ajudarmos um colega que sofre assédio moral, para evitarmos as mudanças de calendário sem nos consultarem, as questões do retorno às aulas em meio à uma pandemia que ceifa 1200 vidas POR DIA no Brasil...]

“Estaríamos equivocados se pensássemos que basta saber as palavras de ordem comunistas, as conclusões da ciência comunista, sem ter assimilado a soma de conhecimentos dos quais o comunismo é consequência” [As tarefas revolucionárias da juventude, Lenin]


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Lenin nos alertou entre 1917-1923 (janeiro de 1924 faleceu) diversas vezes sobre essas armadilhas no campo da Educação e formação política. E longe de ser somente nosso querido camarada. A anarquista espanhola Soledad Villafranca debatia a questão da "neutralidade" e sua IMPOSSIBILIDADE para formação classista nos primeiros anos da década de 1910, e tem professor até hoje falando em ser neutro e crítico! Não existe neutralidade e neutralidade crítica... é uma asneira única.

Krupskaya (URSS), Trotsky (URSS), Giap (Vietnã) [o professor de História que colocou os Estados Unidos de joelhos na Guerra do Vietnã], Sankara (Burkina Faso), Toussaint (Haiti)... TODOS em diferentes períodos históricos, por diferentes caminhares, reconhecem a Educação como mecanismo de disputa no mundo das ideias como mecanismo de práxis revolucionária.

Na verdade, é nítido como pouco caminhamos nesse debate, salvo nesses casos dos grandes militantes. E não é “o professor” (da base), que no ensino superior soa quase como uma entidade opressora de “crianças ingênuas”. É justamente esse professor que está atuando como pesquisador e produzido conhecimento que está fazendo horrores e alimentando esse Golem vicioso.

Um legítimo amontoado de auto ajuda, egocentrismo e fraseologias juntadas, pois foi justamente de "juntar" pedaços de diversos seres humanos que Shelley desenvolveu seu monstro, só que o dela é literário e o nosso é intelectual agindo sobre a vida dos sujeitos!

O Golem pedagógico sobrevive disso, mas pode ir além! Para ampliar sua cadeia alimentar chega a promover torções teóricas e forçar enquadrar teoria e reflexão em textos para obter conclusões almejadas e publicar das mais variadas formas [que pode ser desde textão de FB, artigos acadêmicos e até doutorado]. Para ele não importa o concreto, importa DIZER e NARRAR que emancipou uma criança de 10 anos, ou melhor uma sala de 6º ano APENAS DANDO 4 aulas semanais! Como? Nem Thor, Oxóssi, Athenas, Jeová, Alá, Dagda, Anubis ou Buda explicam.

Pegue um texto rápido sobre assuntos variados em Educação. Analise as conclusões: “com essa pesquisa ALCANÇAMOS E CATARSE”, “dessa forma ALCANÇAMOS A EMANCIPAÇÃO” “dessa forma concluímos que NOSSA ESCOLA SEGUE MODELO GRAMSCIANO (OU ANARQUISTA)” ou “é assim que fazemos uma aula PRAXIATICA”.

Uma reflexão de mínimo bom senso: se na União Soviética, na Comuna de Paris e até mesmo nas Escolas Modernas (de Ferrer e Soledad) os debates dos intelectuais que trabalhavam com Educação era justamente os desafios de, mesmo nesses espaços mais refinados e engajados, de envolver comunidades nos processos escolares do ensino crítico, a formação de quadros políticos e de educadores engajados e até mesmo a dimensão de um “homem novo” imagina nas escolinhas do interior do Bolsolavistão!

Prepotência e má formação complementando-se.

É como se nossos Macunaímas estivessem transgredindo em algum brilho sobrenatural toda historicidade desse lugar, superando as influencias histórias das ideias de Comte e do darwinismo social na visão de mundo do cidadão comum desse lugar. É como se esse ser iluminado por Hannah Arendt superasse os meios de produção da comunicação, a indústria cultural, o fetichismo da mercadoria, a exploração do mais valor, precarização do trabalho, o ápice de ideias fascistas circulando abertamente nos espaços sociais e “sambassem” emancipando sujeitos acima da História. Inclusive como se os próprios assim fossem: emancipados.

Nada materialistas, nada históricos e nada dialéticos. Apenas coachs da Educação em plena narrativa de egos.

Vide a dificuldade que esses textos ou mesmos esses professores (do Ensino Superior ou Educação Básica) tem para se posicionar sobre coisas como o EaD, sobre MMR, Escolas de Tempo Integral, educação crítica... Vide as vezes que abandonam colegas em luta levando bomba do choque enquanto postam aulinhas em suas redes, mas o ego dói tanto que ainda ironizam os que lutam. Vide seus alunos aderindo ao fascismo e reproduzindo as mais diversas formas de opressão em variados níveis de sua vida.

“[...] estamos longe da tarefa do harmonioso cidadão da comuna, e que consiste em forma-lo através de um cuidadoso trabalho de laboratório no curso de um estado transitório da sociedade muito pouco harmoniosa. Tal empreitada seria uma utopia de uma infantilidade lamentável”. [As tarefas da Educação Comunista, Trotsky]

O ponto de partida para termos alguma disputa nisso é desencastelar de idealismos liberais, teorias da CIA e esquerdismo liberal. Olharmos nossa historicidade, avaliar o campo de nossa atividade por todo seu viés concreto e contraditório e disso tirar balanços de atuação. Organizações comunistas podem auxiliar bastante bem como aceitar que precisam fazer o básico: sentar a bunda e ler os BÁSICOS e os CLÁSSICOS.

Pegar Aníbal Ponce, Saviani, Lenin, Krupskaya, Adelino, Soledad...

“A teoria não pode fazer a prática fracassar, quem o faz é a atitude irreflexiva, empírica e grosseira diante dela” [As tarefas da Educação Comunista, Trotsky]

O Golem pedagógico não vai ser destruído facilmente. Pode ser tarefa árdua para muitos, pois a depender do tamanho que cresceu ele se emaranhou com sua própria visão de mundo. Mas só a práxis pode nos libertar disso.

Radicalize-se! (Texto por: Fábio Tardelli)

 
 
 

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© 2020 por F. A. TARDELLI FILHO

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